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terça-feira, 23 de outubro de 2012

Coisas insignificantes

O Nimbus é um espaço de opinião pessoal, mas não pode deixar de partilhar esta obra prima de António Lobo Antunes que num estilo surpreendentemente simples define o nosso país como um autêntico paraíso para criminosos e corruptos, como tantas vezes tenho dito! Que se me permita a ousadia de plagiar o autor:
 
Agora sol na rua a fim de me melhorar a disposição, me reconciliar com a vida.

Passa uma senhora de saco de compras: não estamos assim tão mal, ainda compramos coisas, que injusto tanta queixa, tanto lamento.

Isto é internacional, meu caro, internacional e nós, estúpidos, culpamos logo os governos.

Quem nos dá este solzinho, quem é? E de graça. Eles a trabalharem para nós, a trabalharem, a trabalharem e a gente, mal agradecidos, protestamos.

Deixam de ser ministros e a sua vida um horror, suportado em estóico silêncio. Veja-se, por exemplo, o senhor Mexia, o senhor Dias Loureiro, o senhor Jorge Coelho, coitados.

Não há um único que não esteja na franja da miséria. Um único. Mais aqueles rapazes generosos, que, não sendo ministros, deram o litro pelo País e só por orgulho não estendem a mão à caridade.

O senhor Rui Pedro Soares, os senhores Penedos pai e filho, que isto da bondade as vezes é hereditário, dúzias deles.

Tenham o sentido da realidade, portugueses, sejam gratos, sejam honestos, reconheçam o que eles sofreram, o que sofrem. Uns sacrificados, uns Cristos, que pecado feio, a ingratidão.

O senhor Vale e Azevedo, outro santo, bem o exprimiu em Londres. O senhor Carlos Cruz, outro santo, bem o explicou em livros. E nós, por pura maldade, teimamos em não entender. Claro que há povos ainda piores do que o nosso: os islandeses, por exemplo, que se atrevem a meter os beneméritos em tribunal. Pelo menos nesse ponto, vá lá, sobra-nos um resto de humanidade, de respeito.

Um pozinho de consideração por almas eleitas, que Deus acolherá decerto, com especial ternura, na amplidão imensa do Seu seio. Já o estou a ver:

Senta-te aqui ao meu lado ó Loureiro. Senta-te aqui ao meu lado ó Duarte Lima. Senta-te aqui ao meu lado ó Azevedo

Que é o mínimo que se pode fazer por esses Padres Américos, pela nossa interminável lista de bem-aventurados, banqueiros, coitadinhos, gestores que o céu lhes dê saúde e boa sorte e demais penitentes de coração puro, espíritos de eleição, seguidores escrupulosos do Evangelho. E com a bandeirinha nacional na lapela, os patriotas, e com a arraia miúda no coração. E melhoram-nos obrigando-nos a sacrifícios purificadores, aproximando-nos dos banquetes de bem-aventuranças da Eternidade.

As empresas fecham, os desempregados aumentam, os impostos crescem, penhoram casas, automóveis, o ar que respiramos e a maltosa incapaz de enxergar a capacidade purificadora destas medidas. Reformas ridículas, ordenados mínimos irrisórios, subsídios de cacaracá? Talvez. Mas passaremos sem dificuldade o buraco da agulha enquanto os Loureiros todos abdicam, por amor ao próximo, de uma Eternidade feliz. A transcendência deste acto dá-me vontade de ajoelhar à sua frente. Dá-me vontade? Ajoelho à sua frente indigno de lhes desapertar as correias dos sapatos.

Vale e Azevedo para os Jerónimos, já! Loureiro para o Panteão já! Jorge Coelho para o Mosteiro de Alcobaça, já! Sócrates para a Torre de Belém, já! A Torre de Belém não, que é tão feia. Para a Batalha.

Fora com o Soldado Desconhecido, o Gama, o Herculano, as criaturas de pacotilha com que os livros de História nos enganaram.

Que o Dia de Camões passe a chamar-se Dia de Armando Vara. Haja sentido das proporções, haja espírito de medida, haja respeito.

Estátuas equestres para todos, veneração nacional. Esta mania tacanha de perseguir o senhor Oliveira e Costa: libertem-no. Esta pouca vergonha contra os poucos que estão presos, os quase nenhuns que estão presos como provou o senhor Vale e Azevedo, como provou o senhor Carlos Cruz, hedionda perseguição pessoal com fins inconfessáveis.

Admitam-no. E voltem a pôr o senhor Dias Loureiro no Conselho de Estado, de onde o obrigaram, por maldade e inveja, a sair.

Quero o senhor Mexia no Terreiro do Paço, no lugar D. José que, aliás, era um pateta.

Quero outro mártir qualquer, tanto faz, no lugar do Marquês de Pombal, esse tirano. Acabem com a pouca vergonha dos Sindicatos. Acabem com as manifestações, as greves, os protestos, por favor deixem de pecar.

Como pedia o doutor João das Regras, olhai, olhai bem, mas vêde. E tereis mais fominha e, em consequência, mais Paraíso. Agradeçam este solzinho.

Agradeçam a Linha Branca. Agradeçam a sopa e a peçazita de fruta do jantar. Abaixo o Bem-Estar.

Vocês falam em crise mas as actrizes das telenovelas continuam a aumentar o peito: onde é que está a crise, então? Não gostam de olhar aquelas generosas abundâncias que uns violadores de sepulturas, com a alcunha de cirurgiões plásticos, vos oferecem ao olhinho guloso? Não comem carne mas podem comer lábios da grossura de bifes do lombo e transformar as caras das mulheres em tenebrosas máscaras de Carnaval. Para isso já há dinheiro, não é? E vocês a queixarem-se sem vergonha, e vocês cartazes, cortejos, berros.

Proíbam-se os lamentos injustos.

Não se vendem livros? Mentira. O senhor Rodrigo dos Santos vende e, enquanto vender o nível da nossa cultura ultrapassa, sem dificuldade, a Academia Francesa. Que queremos? Temos peitos, lábios, literatura e os ministros e os ex-ministros a tomarem conta disto. Sinceramente, sejamos justos, a que mais se pode aspirar?

O resto são coisas insignificantes: desemprego, preços a dispararem, não haver com que pagar ao médico e à farmácia, ninharias. Como é que ainda sobram criaturas com a desfaçatez de protestarem? Da mesma forma que os processos importantes em tribunal a indignação há-de, fatalmente, de prescrever. E, magrinhos, magrinhos mas com peitos de litro e beijando-nos uns aos outros com os bifes das bocas seremos, como é nossa obrigação, felizes.

António Lobo Antunes


segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Ameaça Persa

É preciso uma intervenção militar imediata da comunidade internacional. O Irão merece uma lição e, para o mundo, o risco de o atacar militarmente é infinitamente menor do que o cruzar de braços e o assobiar para o ar da europa e dos Estados Unidos.

Adolf Hitler foi pela primeira vez eleito chanceler alemão em 1933 mas apenas invadiu a Polónia a 1 de Setembro de 1939, dando início ao maior e mais sangrento conflito que a humanidade já conheceu.

Levado a sério por poucos, ousou desafiar o mundo colocando em causa as obrigações da Alemanha decorrentes do Tratado de Versalhes ao mesmo tempo que internamente cometia as maiores atrocidades de que há memória sobre o povo judeu. O tom irado e vociferado com que ameaçava os seus inimigos internos e externos fizeram crer à comunidade internacional de que se tratava de um louco sem importância, pelo que nos 6 anos que se seguiram à sua eleição se preparou fortemente para a guerra que alguns suspeitavam que surgiria e que ele próprio provocaria.

Ao entrar em campo, a diplomacia foi sempre demasiado branda com o führer, sendo o mais emblemático e anedótico episódio a chegada ao Reino Unido de Neville Chamberlain a 30 de Setembro de 1938 acenando com os Acordos de Munique no qual o chanceler se comprometia, perante ele próprio, Benito Mussolini e Edouard Delardier a não invadir a Polónia a troco da anexação da Checoslováquia. Adolf Hitler ocupou a Checoslováquia a 15 de Março de 1939 e a 1 de Setembro, as tropas alemãs já marchavam sobre solo polaco.

Mahmoud Ahmadinejad, nascido a 28 de Outubro de 1956, xiita, chegou a líder político supremo do Irão a 3 de Agosto de 2005 contrariando uma certa abertura da nação iraniana ao ocidente, especialmente por ambição e vocação dos seus mais jovens cidadãos. Tornou-se controverso ao assumir-se imediatamente como anti-semita e ao anunciar que a República Islâmica do Irão trabalharia no sentido de erradicar do mapa o estado de Israel.

Afrontou os Estados Unidos da América e os seus aliados tradicionais desafiando-os mais a cada semana. Durante anos, e bem ao jeito de Saddam Hussein utilizou uma forma hábil de fazer política ora avançando e ameaçando, ora recuando estrategicamente para contra-atacar com mais violência.

Nestes mais de 7 anos de poder, nos quais se acredita ter forjado alguns actos eleitorais, Mahmoud Ahmadinejad foi acusado de desenvolver um programa nuclear militar que o próprio foi desmentindo referindo que este se destinava unicamente à produção de energia para fins civis e, paralelamente, foram surgindo relatos e até documentos e testemunhos de que a eliminação do estado de Israel continua a constituir o grande objectivo do Presidente do Irão.

A diplomacia, uma vez mais tomou a dianteira, e aplicou sanções económicas ao Irão. O Irão respondeu com a ameaça de fechar o estreito de Ormuz através do qual passa uma grande parte do petróleo consumido em todo o mundo. De resto, esta forma de ‘tentar fazer política’ - a diplomacia, é quem tem tentado encontrar uma solução para desalojar do poder Bashar al-Assad, o líder xiita da Síria. Tanto num caso como noutro, os resultados estão à vista: Ahmadinejad continua a enriquecer o seu urânio e Bashar al-Assad continua a liquidar o seu povo numa sangrenta guerra civil através da qual se pretende eternizar no poder.

Os Estados Unidos com um Presidente Democrático e demasiado empenhado na sua reeleição e a Europa demasiado envolvida em cimeiras que visam resolver a crise no velho continente, olham para a questão iraniana e para o seu programa com muito distanciamento.

No passado dia 29 de Setembro, Benjamin Nethaniahu, Primeiro Ministro israelita levou à Assembleia Geral da ONU uma célebre infografia na qual referiu que o Irão está muito perto de conseguir produzir a sua primeira bomba nuclear: O mais tardar no início da primavera terá urânio enriquecido suficiente e precisará apenas de um par de semanas para a construir.

Chineses e russos não tomam partido mas inviabilizam uma solução militar e a europa e os estados unidos estão envolvidos nas suas próprias ‘guerras’. Perante este cenário é legítima a inquietude do povo de Israel perante o crescimento militar de um vizinho que ameaça destruí-lo.

O ocidente continua a olhar para o seu umbigo: Os povos estão preocupados com o seu bem-estar social, com o desemprego, com a eleição dos seus líderes e com o agravamento dos impostos. Manifestam-se na rua protestando e tentando solucionar os seus problemas quando aparentemente o mundo tem um desafio bem maior pela frente.

A 17 de Dezembro teremos eleições nos Estados Unidos. Não obstante a minha simpatia pessoal por Barack Obama, seria bom para o mundo que a América mudasse a agulha e elegesse um presidente Republicano, capaz de dar à questão iraniana a atenção que esta deve merecer.

Tenho dito com frequência que o grande legado dos tempos contemporâneos e a grande vitória das sociedades modernas é o clima de paz em que vivemos. Mas desiludam-se aqueles que pensam que este é apenas mais um dos valores adquiridos pelas gerações actuais.

Para os que acham que o Irão tem os mesmos direitos dos seus vizinhos Israel e Paquistão de se constituir como potência nuclear, respondo dizendo que há quem possa ter licença de porte de arma e quem não revele um perfil psicológico para a ter. O Irão está perto, muito perto de ter a bomba e urge, por isso, destruir o seu programa nuclear. É preciso uma intervenção militar imediata da comunidade internacional. O Irão merece uma lição e, para o mundo, o risco de o atacar militarmente é infinitamente menor do que o cruzar de braços e o assobiar para o ar da europa e dos Estados Unidos.

Segundo Benjamim Nethaniau, eles têm mais de 90% do trabalho feito.

sábado, 6 de outubro de 2012

O dia de Portugal

No decorrer do ano, qual é a data mais marcante para cada um de nós individualmente? O dia do nosso aniversário, que assinala o dia em que nascemos ou o dia em que celebramos o nosso casamento ou o nosso divórcio? Será pois razoável sobrepor uma mudança de estado ou de sistema político à data em que surgimos enquanto nação?

Há uns anos atrás estive em Budapeste onde tive oportunidade de assistir às celebrações do dia nacional da Hungria. No último século, a Hungria foi ocupada pelos Nazis durante a primeira guerra mundial e após esta ter terminado, em 1945, manteve-se ocupada desta feita pelos ‘libertadores’ Soviéticos. Tentaram livrar-se por diversas vezes deste jugo, sendo a revolução de 1956 o momento em que estiveram mais próximo de o conseguir. No entanto a Hungria apenas conseguiu garantir a sua independência plena em 1989, após a queda do muro de Berlim e o consequente desmoronamento da influência da União Soviética.

Dessa viagem, uma das memórias que mantenho mais viva é o facto dos húngaros, com um passado sem grandes feitos ou motivos para se orgulhar, com um nível de pobreza muito acentuada e com uma economia mais esburacada do que os seus próprios edifícios, vincarem com grande relevância o orgulho de se ser húngaro e a importância atribuída por estes ao dia nacional da Hungria. Este introito, serve apenas para referir que Portugal deve ser dos poucos países do mundo que não celebra o seu dia nacional, o dia do seu nascimento.

Não obstante Dom Afonso Henriques se ter auto proclamado o primeiro rei de Portugal em 1139, apenas 4 anos depois, a 5 de Outubro de 1143, o Reino de Leão e Castela pela voz do seu primo Afonso VII assumiu a independência de Portugal, assinando em Zamora o tratado que o reconhecia formalmente.

Coincidência ou não, foi também a 5 de Outubro que José Relvas subiu à varanda do actual edifício da Câmara Municipal de Lisboa, na Praça do Município para aí anunciar o fim da monarquia, o nascimento da república portuguesa e proclamar Manuel de Arriaga como o primeiro Presidente da tão ilustre república. Tal como Dom Afonso Henriques, também Manuel de Arriaga só foi formalmente reconhecido algum tempo depois, a 24 de Agosto de 1911, após legitimação eleitoral.

Esta pequena revisitação histórica e o referido paralelismo entre o nascimento da monarquia e da república em Portugal pode levar-nos a uma ampla discussão sobre o verdadeiro simbolismo do 5 de Outubro.

No decorrer do ano, qual é a data mais marcante para cada um de nós individualmente? O dia do nosso aniversário, que assinala o dia em que nascemos ou o dia em que celebramos o nosso casamento ou o nosso divórcio? Será pois razoável sobrepor uma mudança de estado ou de sistema político à data em que surgimos enquanto nação?

E, se à luz do formalismo, é correcto dizer-se que Portugal nasceu com o Tratado de Zamora em 5 de Outubro de 1143, porque não se celebra a implementação da república no dia 24 de Agosto uma vez que só nessa data foi legitimada pelo voto popular.

O dia 5 de Outubro de 1910 deveria apenas ser relembrado como o dia em que uma dúzia de jacobinos e outros tantos maçons subiram a uma varanda para proclamar algo que só veio a legitimar-se quase um ano depois.

E se os republicanos comemoram este dia que não mais é do que um passo na implementação de um novo sistema político, porque não celebram, também ou ao invés, como  dia da república, o dia 1 de Fevereiro de 1908, o dia do regicídio quando os carbonários, o braço armado dos republicanos, assassinaram vilmente o Rei Dom Carlos e o seu herdeiro, o Príncipe Filipe na presença da Rainha Dona Amélia.

A república portuguesa tem 102 anos de história mas Portugal, uma das mais antigas nações do mundo, conta já com 869 anos.

O 5 de Outubro não devia existir enquanto festa republicana mas sim como momento de exaltação de todos quantos exaltam a pátria. Devia ser o dia de Portugal e como tal devia igualmente continuar a ser feriado nacional. Devia ser o dia mais importante da nação, o dia para dar vivas e hurras e gritar Viva Portugal!

 


segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Marquesa de Alorna

A verdadeira vergonha desta história é que o prémio D. Dinis, entregue pela Fundação Casa de Mateus é financiado a cem por cento pelo estado português, ou seja, é pago por todos nós, contribuintes (...) pelo que espero agora que jornais, rádios e televisões tragam a boa nova de que a escritora decidiu devolver o cheque à Fundação, que o doou a alguma instituição de caridade ou que o distribuiu pelos desempregados e reformados de acordo com os seus valores de Abril.

A Fundação Casa de Mateus institui uem 1980 um prémio literário denominado D. Dinis. Desde então, este galardão foi sucessivamente valorizado pela sua entrega a figuras ímpares da nossa história literária contemporânea como Agustina Bessa-Luis (1980), Vergílio Ferreira (1981), Fernando Namora (1982), David Mourão Ferreira (1986), Eugénio de Andrade (1987), Sophia de Mello Breyner Andersen (1989) José Cardoso Pires (1997) ou António Lobo Antunes (1999).

Recentemente, o júri composto por Vasco Graça Moura, Fernando Pinto do Amaral e Nuno Júdice, decidiu atribuir o prémio de 2011 a Maria Teresa Horta pelo seu romance histórico, As luzes de Leonor.

Maria Teresa Horta, nasceu em 1937, e é oriunda de uma família da alta aristocracia portuguesa, que conta com antepassados ilustres como os Condes de Coculim, os Condes de Assumar e os Condes da Torre e ainda com os Marqueses de Fronteira e os Marqueses de Alorna.

Percorreu enquanto jornalista um conjunto de jornais de referência, como O Século, a Capital ou o Diário de Notícias e o seu primeiro título editado em 1960 foi o Espelho Inicial. Foi uma feminista fervorosa tendo feito parte do Movimento de Libertação da Mulher e foi, durante 14 anos, militante do Partido Comunista Português do qual saiu no início dos anos 80 num processo que considerou “muito doloroso, que penosamente se prolongou, ao longo de dois longuíssimos anos”.

Mais do que pelos seus dotes literários provavelmente herdados da também poetisa Marquesa de Alorna, sua antepassada, tem sido motivo de notícia nos últimos dias por se ter recusado receber o prémio das mãos do Primeiro-ministro Pedro Passos Coelho considerando ser “inadmissível receber o prémio de alguém que protagoniza a política que aumenta o desemprego, a pobreza, retira aos reformados o que lhe é devido por terem descontado durante a vida e elimina todos os valores de Abril em Portugal."

De resto, esta tomada de posição por parte de Maria Teresa Horta recolheu nos media grande simpatia e compreensão, não havendo televisão ou pasquim que não se tivesse encarregado de destacar, difundir e amplificar esta atitude por muitos considerada de grande nobreza e estoicismo.

A 20 de Setembro, Maria Teresa Horta, em entrevista ao Diário de Notícias referiu que lhe era “impossível compatibilizar o seu percurso de vida e pensamento com um acto em que estaria presente o principal responsável pelo fim da política cultural”.

Após terem sido consideradas outras personalidades do Executivo para entregar o prémio, todas as hipóteses foram sendo reiteradamente negadas pela premiada, o que, ao abrigo dos valores de Abril que proclama, é um direito que manifestamente lhe assiste. Fernando Albuquerque, Presidente da Fundação Casa de Mateus, cansado de tanta negação, decidiu cancelar a cerimónia solene de entrega do prémio e informou que encerraria o assunto enviando para a morada da premiada o cheque de sete mil e quinhentos euros que complementa o galardão.

A verdadeira vergonha desta história é que o prémio D. Dinis, entregue pela Fundação Casa de Mateus é financiado a cem por cento pelo estado português, ou seja, é pago por todos nós, contribuintes e atribuído pelo governo “que aumenta o desemprego, a pobreza, retira aos reformados o que lhe é devido por terem descontado durante a vida e elimina todos os valores de Abril em Portugal."

A notícia do envio do cheque para a morada de Maria Teresa Horta não gerou nos media o mesmo interesse que a sua particular recusa em o receber das mãos do Primeiro-ministro ou qualquer outro membro do governo, e foi quase subrepticiamente esquecida por estes, pelo que espero agora que jornais, rádios e televisões tragam a boa nova de que a escritora decidiu devolver à Fundação o cheque, que o doou a alguma instituição de caridade ou que o distribuiu pelos desempregados e reformados de acordo com os seus valores de Abril.
Ficava-lhe bem, não acham?